Gênero Relato
O relato é um gênero muito comum no nosso cotidiano, pois relatamos fatos aos nossos amigos e familiares, ouvimos relatos nos noticiários, buscamos relatos de pessoas notórias como inspiração para nossa vida, ou para saber experiências vividas em lugares que desejamos conhecer. Sendo assim, falamos, lemos e escrevemos um relato em diversas situações e em diferentes suportes: revistas, jornais, telefone, redes sociais, sempre com o objetivo de narrar um acontecimento específico para outrem.
O relato também pode ser utilizado como maneira de exemplificar ou argumentar, o que ocorre geralmente dentro da notícia. Sendo assim, o relato pode estar integrado também a outros gêneros.
As características desse gênero são:
- Narrar de forma breve um fato específico vivido por uma pessoa e suas consequências, reflexões;
- Apresentar elementos básicos da narrativa tais como: sequência de fatos, pessoas, tempo, espaço.
Os elementos gramaticais e de linguagem que o compõem são:
- O narrador será protagonista, ou participante da ação;
- Verbos e pronomes são empregados predominantemente na 1ª pessoa;
- Os verbos oscilam entre o pretérito imperfeito e pretérito perfeito (tempo passado);
- Emprega-se o padrão culto da língua;
- Priorizam-se as ações e a descrição do lugar onde elas ocorreram (é preciso fazer o leitor “visualizar” o ambiente e os envolvidos);
- Uso de advérbios para marcar a sequenciação das ações;
- Pode usar de adjetivações e descrições, mas não podem predominar no texto.
Sua estrutura é composta por:
- Título;
- Introdução: contexto, personagem, tempo/espaço, fato/ problema
- Desenvolvimento: construção da trama, clímax
- Conclusão: desfecho, reflexão.
- Resposta às perguntas: Quando? Onde? Quem? O quê? Como? Por quê?
Análise de um relato
Análise de um Relato |
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Lugar
Tempo 1ª p. Pretérito imperfeito Descrição Mudança no tempo/ local do relato. Marca de progressão da narrativa Reflexão no presente Pretérito perfeito |
INTRODUÇÃO: |
[...] Em Santos, onde morávamos, minha mãe me lia histórias, meu pai gostava de declamar poesias. Foi em algum momento do ginásio – por volta do que hoje seria a sexta ou sétima série – que li de começo a fim um romance: Inocência, de Taunay, é minha mais remota lembrança de leitura de um romance brasileiro. Livro aberto nos joelhos, afundada de atravessado numa poltrona velha e gorda, num quartinho com máquina de costura, estante de quinquilharias e uma gata branca chamada Minie. | |
DESENVOLVIMENTO: | |
Até então, leitura era coisa doméstica. Tinha a ver apenas comigo mesma, com os livros que havia na estante de quinquilharias de meu pai e com os volumes que avós, tias e madrinhas me davam de presente. No cardápio destas leituras, Monteiro Lobato, as aventuras de Tarzan, os volumes da Biblioteca das Moças. O sítio do Pica pau Amarelo, as florestas africanas, castelos e cidades europeias constituíam a geografia romanesca que preenchia meus momentos livres. Mas um dia a escola entrou na história. Dona Célia, nossa professora de português, mandou a gente ler um livro chamado Inocência. Disse que era um romance. Na classe tinha uma menina chamada Maria Inocência. Loira desbotada, rica e chata. Muito chata. Alguma coisa em minha cabeça dizia que um livro com nome de colega chata não podia ser coisa boa. Foi por isso que com a maior má vontade do mundo é comecei a leitura do romance de Visconde de Taunay, de quem eu nunca tinha ouvido falar: visconde, para mim, era o de Sabugosa. Fui lendo a frio, sem entusiasmo nenhum. O presságio da chatice confirmava-se, até que apareceu o episódio das borboletas. Aí me interessei pelo livro: um alemão corria caçando borboletas e depois dava a uma delas o nome da heroína do livro... Gostei. Não muito, mas gostei. E passei a olhar o nome das borboletas com olhos diferentes: alguma delas seria a papilo innocentia da história? Por alguma razão, encantou-me o gesto de nomear, episódio completamente secundário nas interpretações mais tradicionais do romance. Acho que passei batida pelo enredo amoroso, pela caturrice do pai da moça, pela charlatanice do médico ambulante. Mas – apesar do latim – seduziu-me a ideia delicada de homenagear alguém dando seu nome a uma coisa bonita, mesmo que esse alguém nunca ficasse sabendo da homenagem. Mas não me entreguei completamente: passei a chamar de Papilosa minha colega chata, e o apelido pegou! Não incluo Inocência entre os melhores livros que li, mas foi ele que me ensinou a ler romances e a gostar deles: desconfiando primeiro, abrindo trilhas depois e, finalmente, me entregando à história. Depois vieram outros, em casa e na escola. Com o tempo virei uma profissional da leitura, dando aula de literatura em colégios, cursinhos e faculdades. Mas a leitura profissional – embora seja um outro lance – nunca abafou a expectativa com que abro um novo romance: sei que ali me espera um universo inteiro, que posso aceitar ou recusar. Palavras e frases se encorpam em personagens, em objetos, em cenários, em emoções. O romance sempre engendra surpresas. Que podem me seduzir ou me deixar indiferente. |
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CONCLUSÃO: | |
Até hoje, com um romance na mão, e como se eu estivesse no quartinho dos fundos de minha infância, pronta para afundar na poltrona velha e gorda. Sei que posso reviver a experiência da leitora antiga, que se surpreendeu ao encontrar uma história de borboletas com nome de gente num livro que parecia prometer apenas meninas chatas e ricas. Assim, livros e leituras foram ocupando espaços cada vez maiores. Na minha casa e na minha vida. A estante do quartinho dos fundos ampliou-se. Ler e falar de livros virou profissão e muitos romances brasileiros continuaram a construção da leitora que sou hoje. Dentre estes, alguns representaram momentos especiais. Pela situação de leitura, pela forma como chegaram às minhas mãos, pela pessoa que os escreveu, pelo título, capa ou nome de uma personagem, vai saber... |
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(Marisa Lajolo. Como e por que ler o romance brasileiro. Rio de Janeiro: Objetiva, 2004.) | |